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Robert Vinten e Maria Gabriela Ferreira

Odair Moniz era um homem de 43 anos com três filhos de 19, 18, e 2 anos. Trabalhava como cozinheiro num restaurante em Lisboa, mas estava de baixa médica devido a queimaduras nas mãos. Era considerado pacífico e era apreciado pelos seus vizinhos do Zambujal, um subúrbio de Lisboa.

Na madrugada de 21 de Outubro de 2024, regressava de uma festa quando a polícia começou a perseguir o seu automóvel. Bateu noutros carros e foi depois perseguido a pé pela polícia. A polícia disparou três ou quatro tiros — um ou dois para o ar e dois na direcção de Odair. Uma das balas atingiu-o no peito e morreu pouco depois.

Foi noticiado que estava a conduzir um carro roubado quando a polícia iniciou a perseguição, mas este relato revelou-se ser falso. Estava a conduzir o seu próprio carro.

A polícia começou por declarar que Odair empunhava uma arma afiada quando foi atingido, mas os agentes que estavam no local disseram que ele não empunhou qualquer arma e há vídeos da situação que o mostram com as mãos no ar e sem qualquer arma.

No dia seguinte, houve um protesto no Zambujal exigindo justiça, e na noite de 22 de Outubro a polícia invadiu a casa da família de Odair Moniz e atacou algumas pessoas que lá se encontravam. A polícia negou este facto, mas um vídeo divulgado pela Record TV Europa mostra a polícia a entrar no prédio onde morava Odair Moniz e moradores disseram que era a segunda vez que a polícia ali estava, depois de ter arrombado a porta.

O agente da polícia que disparou o tiro que matou Odair Moniz foi constituído arguido por homicídio, mas não foi suspenso nem transferido.

A organização SOS Racismo reforçou que «Odair Moniz junta-se à longa lista de pessoas negras mortas às mãos da polícia de segurança pública. A sua morte acontece num contexto político de exacerbação do discurso de ódio e de um securitarismo estigmatizante dirigido às comunidades negras».

O ano passado, um comité das Nações Unidas mostrou preocupação com o excesso de força exercido pela polícia em Portugal, citando informação que sugeria tratar-se de «uma prática enraizada contra pessoas de ascendência africana».

«Não há justiça num sistema racista»

Uma manifestação foi convocada para o dia 26 de Outubro, organizada pelo movimento Vida Justa e apoiada por inúmeras organizações dedicadas ao combate ao racismo e à violência policial. Milhares desceram a Avenida da Liberdade — uma larga avenida no centro de Lisboa — em direcção aos Restauradores, a grande praça onde termina a avenida.

Os manifestantes levavam cartazes, nos quais se podia ler «Não há justiça num sistema racista», «Sem justiça não há paz», «Ka tem justisa, ka tem paz» (em crioulo cabo-verdiano), «Black Lives Matter», «Parem de nos matar», e também bandeiras do movimento Vida Justa, de Cabo Verde e da Palestina.

O Chega, partido de extrema-direita, organizou uma manifestação de muito menor dimensão, 200 a 300 pessoas, em apoio ao agente da polícia que matou Odair Moniz. Representantes do Chega proferiram comentários racistas nojentos após ter sido noticiada a morte de Odair.

O líder do Chega, André Ventura, afirmou que o agente que baleou Odair Moniz devia ser «condecorado e não constituído arguido» e Pedro Pinto disse, na RTP, que «Se as forças policiais disparassem mais a matar, o país estava mais na ordem». Um assessor do Chega, Ricardo Reis, publicou nas redes sociais que havia menos um «criminoso» nas ruas, apesar de não ter quaisquer provas que corroborassem o que dizia.

Quarenta pessoas apresentaram uma queixa-crime contra estes três membros do Chega e uma específica contra Ventura por disseminar notícias falsas que poderão causar alarme ou agitação social. Uma petição online de apoio a estas queixas-crime contra os membros do Chega rapidamente reuniu 125 000 assinaturas.